segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

“A relação entre as duas polícias nunca foi boa”


Alissandra Mendes


Os policiais militares reivindicam melhorias salariais, mudanças no quadro organizacional da corporação e na carga horária e caso não sejam atendidos pelo Governo do Estado, eles não descartam uma paralisação no Carnaval.







Em entrevista ao jornal Aqui Notícia, o diretor da Associação de Cabos e Soldados (ACS/PMBM/ES), Flávio Gava, contou que a relação da Polícia Militar com a Polícia Civil nunca foi boa e está ainda mais estremecida, principalmente após a prisão do comandante do Batalhão de Ibatiba e cinco policiais militares da unidade.

Nesta semana, a PM anunciou que poderá paralisar suas atividades assim que for realizada a Assembléia Geral. “Deflagramos um movimento para reivindicar a favor da categoria e conclamamos todos os militares a entrarem em estado de alerta e em breve será marcada uma Assembleia Geral Unificada para saber o rumo que vamos tomar”, disse Gava.

Ele explicou também sobre os conflitos entre a PM e a cúpula de segurança do Governo. “Esse foi o estopim da relação do governo com a PM”, completou.


Aqui Notícias - Quais os problemas enfrentados hoje pelos policiais militares?

Gava - Em primeiro lugar é a falta de estímulos causada pelos baixos salários e a dificuldade de relação da Polícia Militar com a Polícia Civil, principalmente quando tem que entregar uma ocorrência na delegacia, além da carga horária excessiva. A escala os policiais é escravizando, não temos uma definição apesar de ter uma portaria para escala específica. O Governo se esquece que não é com viatura e arma que faz a polícia ficar estimulada. Hoje na PM o clima de insatisfação é de 100%. Temos também a adição do regulamento disciplinar que é arcaico e desumano e não conseguimos mudar. Em segundo são as promoções e salários. Tem soldado que trabalha aí de 18 a 20 anos e ainda não foi promovido a cabo. Eu mesmo tenho 15 anos de soldado e não fui promovido e com isso desanimamos e ficamos desestimulados. O Governo é cego para isso, mas espero que os olhos se abram antes do Carnaval.


AN - Quais as reivindicações da classe?

Gava - Passam pela insatisfação, reivindicações, mudanças e melhoria salarial – buscamos o realinhamento salarial e o realinhamento do subsidio e promoções. Esse pedido já foi encaminhado ao deputado Da Vitória. Para ser promovido de cabo a 3º sargento é com 25 anos, de acordo com a existência de vagas. Para se ter uma ideia, no Bombeiros o soldado é promovido entre oito a 10 anos, e esperamos que ainda neste ano, os soldados sejam promovidos a cabo na PM oito a nove anos por antiquidade. A reivindicação complementar é o aumento do quadro organizacional, isso é prioridade. Já nos reunimos  com todas as associações para discutirmos isso e também a nossa carga horária que é definida por lei como 40 horas semanais e hoje deveria ser 12/24 ou 12/72 e como o secretário de Segurança Pública não admite mudança, temos uma compensação de 12 horas todo terceiro dia de folga. A PM tem muita demanda e cabe ao Governo contratar mais policiais, pois não podemos ser escravizados. O Comando Geral se comprometeu a regulamentar essa questão da escala através de uma portaria. Isso acontece por indisposição do secretário de Segurança Pública.


AN - O conflito com o Governo do Estado tem a ver com a prisão do tenente coronel e de policiais militares em Ibatiba durante da operação Magogue?

Gava - Não tem relação nenhuma. Essa insatisfação não é exclusividade do Espírito Santo. O Ceará entrou em greve, o Pará entrou em greve, o Paraná vai parar e o Rio de Janeiro também. Esse é um movimento nacional. O policial não aguenta mais a falta de respeito. A polícia é o único braço armado que fica diuturnamente na rua. Ninguém toma o espaço da PM. O que estão fazendo com os policiais é falta de respeito, de consideração. O conflito vai depender do que o governo quer, mas não tem relação com as prisões.


AN - Uma informação extra-oficial diz que logo após essa prisão circulou um e-mail nos batalhões do Espírito Santo para que a PM não apóie nenhuma ação da Polícia Civil. O senhor tem conhecimento disso? Qual a sua opinião? É correta essa atitude?

Gava - Corretíssima a atitude. É verdade sim, circulou o e-mail. O que fizeram foi uma falta de respeito absurda. Entraram no Batalhão, que é um dos menores do estado, e prenderam o comandante. Se fosse em Vitória ia dar morte, mas não entravam. Em Vitória a Polícia Civil não entra em Batalhão. Foi uma falta de respeito fora do normal a forma como a prisão foi feita. Já instauraram 17 inquéritos contra o tenente coronel e não tem nenhuma prova sequer da participação dele, estão fazendo isso para justificar o ato. Estive no Tribunal de Justiça e solicitei ao Geti uma cópia do processo e até hoje não me cederam. Os policiais militares estão muito revoltados. Os delegados da Polícia Civil estão sobrecarregados e há muito tempo e estão usando a PM para forçar o Governo e fazer mais contratações e para ter mais profissionais. Agora nas delegacias, os delegados não estão recebendo ocorrências da PM após determinado horário e o policial militar tem que se deslocar a 150/200 km para entregar a ocorrência em outra delegacia. Esse é um problema gravíssimo que prejudica o trabalho da PM. A relação entre as duas polícias nunca foi boa e a primeira medida para resolver o problema é igualando os salários. A Polícia Civil recebe um salário bem mais alto que da Polícia Militar. Nesta semana o secretário de Segurança Pública entregou 183 novas viaturas à PM e nenhuma delas tem ar condicionado, já as viaturas da PC têm ar condicionado. Quero ver o secretário ficar dentro de uma viatura o dia todo sem ar condicionado. Passamos o dia todo com uma farda chumbão de manga e com colete no calor e sem ar. Vamos entregar uma denúncia ao Ministério Público em relação a isso.


AN - É verdade que há uma insatisfação da PM com a cúpula da segurança do governo?


Gava - Lógico. Estamos conversando com o Henrique Herkenhoff desde o ano passado. Ele é contra tudo. Negociamos com ele o ano todo e conversamos o ano todo e ele mandou um projeto de R$ 32 milhões para a Assembléia sem nos consultar. Tivemos que correr por fora para impedir. Esse foi o estopim da relação do governo com a PM. A interlocução agora tem sido feito através do comandante geral da PM, com a Seger e com a Secretaria de Governo.


AN - Como o senhor define a carga horária do policial militar hoje?


Gava - Escravizante. É um sonho que virou pesadelo. Trabalhamos mais agora do que antes. Todo terceiro dia tem compensação. O Comando Geral nos prometeu essa semana uma mudança nessa situação e vamos aguardar. A nossa escala hoje é desumana.


AN - A classe já foi procurada pelo governo para impedir uma possível paralisação?

Gava - Nesta semana estive conversando com o governador e ele mesmo demonstrou preocupação com isso. Mas, vamos esperar, pois quem vai ditar o nosso rumo será ele.


AN - Uma das reivindicações é a mudança no quadro organizacional, quais seriam essas mudanças?

Gava - O quadro estabelece a quantidade de vaga por nível hierárquico, falamos de mudança nesse sentido. Queremos mais vagas para possibilitarmos as promoções. Para novas promoções seriam necessárias mais vagas. Precisamos de mais vagas.


AN - Qual a avaliação que a Associação faz sobre a segurança pública no Espírito Santo?

Gava - Pode melhorar muito mais se os PMs estiverem bem remunerados e com escalas justas. Estimulados produzem muito mais. O Governo precisar acertar o alvo, não investir em máquinas e equipamento e sim no ser humano. Se isso acontecer o reflexo será instantâneo. Hoje eles dizem que o índice de criminalidade está sob controle e creio que está, mas ainda pode melhorar mais.

Fonte: Aqui Notícias

Nenhum comentário: